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Mudanças climáticas e a água: do planejamento à prevenção
Alterações do clima afetaram mais de 125 milhões de brasileiros em duas décadas
As mudanças climáticas têm se manifestado de maneira cada vez mais preocupante em todo o mundo, impactando ecossistemas e recursos naturais essenciais. Segundo informações do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), o Brasil está entre os países com maior vulnerabilidade nesse cenário, com projeção de agravamento de perdas materiais e humanas caso medidas de mitigação e adaptação não sejam tomadas com celeridade e em escala nacional.
Análises de seis décadas de dados climáticos no Brasil, entre 1961 e 2020, evidenciam o curso das mudanças climáticas com danos aos sistemas naturais, terrestres e oceânicos, humanos, de infraestrutura e produtivos. De acordo com estudos do MMA, as alterações do clima afetaram mais de 125 milhões de brasileiros em duas décadas, resultando em perdas econômicas que ultrapassam US$ 60 bilhões. As projeções para o país indicam a intensificação das temperaturas e a redução e concentração da precipitação, aumentando a ocorrência de desastres, doenças, perdas agrícolas, insegurança alimentar, entre outros impactos severos sobre a população e a economia.
“A busca por soluções sustentáveis e a conscientização sobre a importância da preservação ambiental são passos cruciais para garantir um futuro equilibrado e resiliente para a Bacia do Paraíba do Sul”.
Marcelo Manara, presidente do CEIVAP
O ciclo hidrológico, por exemplo, está diretamente vinculado às alterações de temperatura da atmosfera e ao balanço de radiação de energia terrestre. De acordo com o que sinalizam os modelos de projeção, as mudanças climáticas devem gerar, entre outras consequências, novos padrões de intensidade e variabilidade da precipitação, o que poderá afetar significativamente a disponibilidade e a distribuição temporal da oferta hídrica nos rios.
Estudos científicos da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) mostram que os eventos hidrológicos críticos, como as secas e as enchentes, poderão tornar-se mais frequentes e mais intensos. E, além dos impactos esperados no regime hidrológico, há as prováveis mudanças na demanda de diversos setores usuários, que devem aumentar acima das previsões realizadas.
Mais ainda, publicações recentes da ANA constatam que a elevação da temperatura e da evapotranspiração poderá acarretar, entre outros efeitos, em demandas cada vez maiores de irrigação, refrigeração, consumo humano e dessedentação de animais em determinados períodos e regiões, além de afetar a capacidade de reservação e o balanço hídrico. Assim, o setor de recursos hídricos considera que as incertezas oriundas da mudança climática incidirão tanto do lado da oferta como também da demanda hídrica.
Medidas de adaptação
O Plano Nacional de Recursos Hídricos (PNRH) 2022-2040, por meio do Programa 4 Integração da Política Nacional de Recursos Hídricos com Políticas e Planos Setoriais e do Subprograma 4.4. Medidas de Adaptação às Mudanças Climáticas, tem por objetivo avaliar o impacto das mudanças climáticas nos recursos hídricos. Os eventos extremos de seca e cheias incluem-se no escopo a ser analisado, visando obter estratégias de adaptação para a gestão de recursos hídricos.
De acordo com o PNRH, é preciso adaptar-se aos impactos esperados, ocasionados seja pela variabilidade natural do clima, seja pelas mudanças climáticas, a fim de minimizá-los. A gestão adaptativa coloca-se como alternativa para orientar a ação nesse futuro ambiente de complexidade e incerteza. Entende-se como gestão adaptativa em recursos hídricos o processo de melhoria da política e de práticas por meio do aprendizado sistemático dos resultados de estratégias de gestão implementadas, levando em conta mudanças em fatores externos, principalmente mudanças de ordem climáticas.
Neste contexto, foi traçado um conjunto de diretrizes que se materializarão em ações para subsidiar o melhor entendimento acerca das mudanças climáticas nos recursos hídricos e apoiar de forma mais efetiva as estratégias de adaptação a serem utilizadas (veja no quadro).
Diretrizes em prol das estratégias de adaptação às mudanças climáticas
• Monitorar e avaliar as alterações no regime hídrico e a ocorrência de eventos extremos no Brasil;
• Avaliar sistematicamente as possibilidades alterações no regime hídrico e a ocorrência de eventos extremos no Brasil no futuro, a partir das projeções climáticas oriundas dos diferentes cenários de emissão e modelos climáticos globais (MCGs);
• Aprimorar os instrumentos da Política Nacional de Recursos Hídricos como estratégia de adaptação às mudanças climáticas;
• Avaliar o impacto das mudanças climáticas nos setores usuários de recursos hídricos;
• Avaliar e quantificar os impactos socioeconômicos associados à disponibilidade de recursos hídricos resultantes das mudanças climáticas;
• Propor estratégias de adaptação às mudanças climáticas nos recursos hídricos, com a estimativa de custos para a sua implementação;
• Apoiar a produção de conhecimento e Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I) no tema de mudanças climáticas, tanto no fornecimento de informações importantes na tomada de decisão como na definição de estratégias de adaptação;
• Capacitar o SINGREH para a temática;
• Incorporar os estudos desenvolvidos aos Planos de Recursos Hídricos de bacias hidrográficas, subsidiando as propostas de ações a serem desenvolvidas na sua área de abrangência;
• Apoiar e subsidiar a Política Nacional sobre Mudança do Clima no que se refere à gestão de recursos hídricos;
• Observar as diretrizes do Plano Nacional de Adaptação às Mudanças Climáticas para desenvolvimento das ações do Programa.
Bacia do Paraíba do Sul
A bacia hidrográfica do Paraíba do Sul tem experimentado alterações significativas em seu equilíbrio ambiental, sendo afetada por eventos climáticos extremos e transformações nos padrões de precipitação. O Rio Paraíba do Sul, que se estende por três estados brasileiros (São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro), desempenha um papel crucial no abastecimento de água para milhões de pessoas, além de ser vital para a agricultura e indústria da região. Contudo, as mudanças climáticas têm desencadeado uma série de desafios, ameaçando a sustentabilidade desse ecossistema.
Um dos impactos mais evidentes é o aumento na frequência e intensidade de eventos críticos, como chuvas muito fortes e secas prolongadas. Essas variações climáticas afetam diretamente o nível dos rios, comprometendo a disponibilidade de água para consumo humano, irrigação e produção de energia hidrelétrica.
Tendo em vista esses cenários, previstos no Plano Integrado de Recursos Hídricos da Bacia do Paraíba do Sul (PIRH-PS), o Plano de Gerenciamento de Risco (PGR) da Bacia do Paraíba do Sul foi consolidado em outubro de 2022. Com investimentos de R$ 1,6 milhões do CEIVAP, o PGR foi desenvolvido pelo Consórcio Nippon Koei Lac do Brasil (NKLac) e Geologia, Engenharia e Estudos Ambientais Ltda. (REGEA), e acompanhado pelo Grupo de Trabalho para Acompanhamento da Elaboração do Plano de Gerenciamento de Risco da Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul (GT-PGR).
Para o presidente do CEIVAP, Marcelo Manara, o cenário presente e as perspectivas de futuro reforçam a importância de uma gestão sustentável dos recursos hídricos na região. Segundo ele, isso envolve a implementação de políticas públicas que promovam a conservação dos mananciais, a preservação de áreas de recarga hídrica e a busca por alternativas para mitigar os impactos das mudanças climáticas. “O impacto das mudanças climáticas na bacia é uma realidade que exige ação imediata e coordenada. A preservação desse recurso natural essencial não apenas para a região, mas para todo o país, é uma responsabilidade compartilhada por todos os envolvidos. A busca por soluções sustentáveis e a conscientização sobre a importância da preservação ambiental são passos cruciais para garantir um futuro equilibrado e resiliente para a Bacia do Paraíba do Sul”.
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